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terça-feira, 28 de maio de 2013

Diários de viagem de Humboldt à América do Sul poderão ser leiloados



Caso fracassem as negociações entre a família e o governo alemão, os diários da viagem que Alexander von Humboldt fez à América do Sul poderão ser leiloados. Eles correm o risco de desaparecer em um cofre particular.
Para entender o mundo é preciso percorrê-lo e medi-lo. Esse lema perseguiu Alexander von Humboldt – de forma bastante consequente. Como vulcanólogo e alpinista, no Equador, ele escalou o vulcão Chimborazo, de 6.300 metros de altitude. Como naturalista, na Guiana, ele se deixou picar pelos insetos que colecionava. Em países como México, Peru e Colômbia, ele fez registros da altitude e localização de costas e lagos, anotando também a temperatura do ar e da água.
Mas além de toda a coleta de dados, o romântico Humboldt podia também entrar em transe ao escutar o concerto noturno de pássaros e outros animais na floresta. Em 1799, ele viajou como pesquisador para a América do Sul. Quando voltou para a Europa, em 1804, partiu como amigo do continente americano. Não foi à toa que o herói da independência venezuelana, Simón Bolívar (1783-1830), considerava Humboldt "o verdadeiro descobridor do continente".
O diário como obra
As descobertas de Humboldt foram documentadas meticulosamente. Sempre que teve tempo, ele anotou os dados das medições em seus diários e descreveu as impressões cotidianas, reunindo 3.442 páginas de ensaios científicos com base em suas pesquisas de campo. Escritos principalmente em francês, mas também em alemão e com eventuais palavras em latim, decorados com desenhos a mão livre e artefatos colados nas páginas, os nove volumes que compõem os diários são mais do que apenas um documento sobre os países visitados.
Para Eberhard Knobloch, diretor do Centro de Pesquisa Alexander von Humboldt na Academia de Ciências de Berlim-Brandemburgo, trata-se não somente "dos mais abrangentes, mais também dos mais famosos diários que um viajante jamais elaborou".
Diários são mais do que tinta e papel
Comércio com bens culturais
Assim, foi grande o alvoroço quando veio a público a notícia de que esses diários estariam à venda. Na pior das hipóteses, eles poderão ser vendidos à melhor oferta – e desaparecer nos cofres de um proprietário particular.
Depois de serem diponibilizados na Biblioteca Estatal de Berlim a cientistas após a Segunda Guerra Mundial, os diários foram devolvidos em 2005 aos herdeiros legítimos de Humboldt, a família Von Heinz. Como a família havia prometido manter o acesso público aos diários, perdeu-se a oportunidade de colocá-los na lista de patrimônios culturais nacionais. Um grande erro, pois agora os herdeiros podem retirá-los do país sem problemas e levá-los a leilões internacionais de alto nível. Bem lembrado: poderiam.
Pois a família ainda está em negociações exclusivas com a Fundação do Patrimônio Cultural Prussiano. No entanto, o preço pedido pelos herdeiros é bastante elevado – fala-se em mais de 10 milhões de euros –, e o orçamento estatal mesmo na rica Alemanha é escasso. Caso não se chegue a um acordo, não faltarão ricos compradores particulares.
Pelo menos é o que avalia o leiloeiro berlinense Wolfgang Mecklenburg, que se especializou em manuscritos originais de personalidades históricas famosas: "Poderiam aparecer compradores que nem são colecionadores de manuscritos. Eles diriam: 'eu pago com prazer o preço que for pedido'. Principalmente se tratando de um ícone como Alexander von Humboldt, reverenciado em particular na América do Sul".
A lenda Humboldt
De fato, o apelo do nome Humboldt continua inabalável. Sobretudo na América do Sul ele é lembrado não somente por suas realizações científicas, mas também por sua postura contra o colonialismo e a escravidão. Segundo o pesquisador Eberhard Knobloch: "Os índios dali eram cidadãos de segunda classe, enquanto os missionários católicos atuavam como dominadores, tratando os nativos como crianças. Ele [Humboldt] assumiu publicamente uma postura sólida contra a escravidão, pois todos tinham o mesmo valor para ele, independente da raça."
Retrato de Alexander von Humboldt (1769-1859), pintado por C.W. Peale, em 1804
No entanto, suas posições políticas enfrentavam obstáculos, e ele teve que entrar em acordo com os governantes da época. Como filho de uma família nobre prussiana e parte da elite política da Prússia, ele assumiu o compromisso de fidelidade ao rei. E o soberano prussiano pouco apreciava as ideias de igualdade da Revolução Francesa.
A coroa espanhola, no entanto, forneceu-lhe dinheiro e liberdade irrestrita de viajar, esperando, em troca, informações sobre recursos naturais.
"Ele estava consciente de que havia certo risco de que seus conhecimentos fossem utilizados de uma forma que não o agradasse. Ao mesmo tempo, ele se via na obrigação de trazer resultados", afirma Knobloch. "Isso também era verdade para Thomas Jefferson, o então presidente norte-americano. Quando ele [Humboldt] lhe disponibilizava material cartográfico, isso tinha invariavelmente um aspecto militar."
Apesar dessas limitações, Knobloch salienta que, para a época, as posições políticas e sociais de Humboldt eram surpreendentemente progressistas e esclarecidas. Da mesma forma, o espírito iluminista também se refletiu em sua pesquisa científica. Equipado com uma variedade de instrumentos, incluindo sextantes, barômetros e termômetros, ele mediu o Novo Mundo como os astrônomos da antiguidade, que haviam registrado o curso da estrelas com a ajuda de lunetas, chegando a uma nova compreensão do universo.
Como sábio universal, Humboldt possuía conhecimentos de matemática, vulcanologia, paleontologia e climatologia, podendo fazer combinações dos resultados das medições de uma forma que, hoje, corresponderia a uma perspectiva interdisciplinar, observa Knobloch: "Isso fica evidente, por exemplo, na geobotânica, uma disciplina que ele fundou em grande parte. Ele dizia 'não basta que eu seja geógrafo e me interesse pela forma da montanha. Preciso ver, ao mesmo tempo, como se comporta a flora local.' E, em seguida, chega-se à conclusão de que as coisas estão inter-relacionadas: numa determinada região e determinada altitude, só podem ser encontrados determinados tipos de plantas."
Após sua volta à Europa, os diários de viagem à América do Sul não foram para Humboldt uma obra acabada, mas um projeto de vida, uma espécie de mina, da qual ele se serviu por muitos anos.
Cofre particular ou arquivo público?
Ainda hoje, a variedade de dados precisos dos diários interessam não somente a pesquisadores de Humboldt, mas também a climatologistas, por exemplo, em busca de informações sobre antigas linhas de precipitação de neve ou temperatura da água. Para melhorar o acesso a esses dados, eles têm de ser preparados segundo métodos editoriais modernos, diz Knobloch.
Atualmente, apenas microfilmes dos nove volumes estão disponíveis publicamente. Um trabalho completo de avaliação do material só é possível com os originais, explica o pesquisador de Humboldt. Se os diários estarão disponíveis, vai depender do curso das negociações.
Fonte da Informação: http://www.dw.de/

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